J. e o suicídio do filho
[Arnaldo Divo Rodrigues de Camargo]
Disse-lhe o jovem: Tudo isso tenho guardado desde a minha mocidade; que me falta ainda? Disse-lhe Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens e dá-o aos pobres, e terás um tesouro no céu; e vem, e segue-me. (Mateus 19:20-21)
“Fui surpreendido quando meu filho disse que estava pensando em suicídio e me pediu para ser internado. Como ‘ser internado por pensamento de suicídio’? Mas ele me disse mais coisas: ‘Pai, eu estou bebendo demais e usando cocaína e você não percebe?’.”
Essa foi a fala de meu amigo J., que me procurou para saber como é a internação (para seu filho), por quanto tempo, quanto custa…
Continuou meu amigo: “Eu achava que o estado alterado às vezes do meu filho era pelo álcool e, como eu também gosto de bebida, não me importava muito. O que me assustou, horrivelmente, e me afligiu, foi ouvir que ele estava pensando em se matar”.
Eu lhe disse: “Procure se tranquilizar. Realmente é grave, ninguém deve nem pensar nessa possibilidade, quanto mais praticar. Mas suicídio não é morte”.
“Como não é, Arnaldo? É sim, e de forma trágica.”
Eu lhe expliquei que a morte é apenas uma passagem, desta existência para a vida espiritual; a alma não morre, apenas o seu corpo perece, e seu espírito vai sofrer as consequências do desatino e desrespeito à Lei, pois a vida continua e ele vai ter oportunidade de se reabilitar.
O pai do jovem, para quem foi necessária a internação – o que evitou um acidente de veículo ou uma overdose –, depois da recuperação do mesmo, e estando em casa e de retorno a um novo emprego, me confidenciou: “Arnaldo, meu apego era tão grande ao meu filho, que se ele morresse eu acho que morreria com ele. No tempo em que esteve na clínica, eu falava com ele uma vez por semana e uma vez por mês tinha visita familiar e eu levava tudo que ele precisava e outras que nem pedia, minha satisfação era agradá-lo. Mas diariamente ligava na clínica para saber como ele estava, inclusive de sábado e domingo. E quando não atendia o telefone da clínica eu ligava na casa do dono ou do psicólogo. Veja como era meu descontrole e ansiedade”.
Hoje sabemos que a ansiedade compromete as defesas do corpo, o sistema de imunidade. Ela, a ansiedade, e sua parceira o estresse, aumentam o nível de adrenalina. Essa é uma defesa do organismo: o hormônio consome energia para se preparar para uma situação de “perigo”, que estamos enfrentando ou vamos enfrentar. Quando isso acontece de forma esporádica, é um processo natural, e ele vai se recompor. A longo prazo, no entanto, como no caso de J., as defesas imunológicas podem ficar prejudicadas.
Nestes casos, o acompanhamento psicológico para o pai, manter-se ativo fisicamente e boa alimentação ajudam na superação, porém, buscar ajuda espiritual em sua igreja de escolha, em sua liderança, e também em grupos de mútua ajuda, esta última fundamental, como o Alanon (Amigos e familiares de Alcoólicos Anônimos), Amor Exigente e Nar-Anon (Amigos e familiares de Narcóticos Anônimos).
Quando o príncipe, ou moço rico, da introdução do nosso texto, procura por Jesus, ele confessa que cumpria todos os dez mandamentos e pergunta o que faltava para alcançar o reino do céu. E o Mestre então recomenda desligar-se da família, doar seus bens aos pobres e segui-lo, o que deixou o homem triste.
Esse é um exercício que temos que fazer todos os dias: desapegar-nos dos bens materiais e dos bens emocionais. Tudo é empréstimo de Deus, o corpo, o filho, a esposa, a família, cedo ou tarde vamos deixá-los ou eles vão nos deixar e a vida continua com o mesmo amor, só que eles temporariamente afastados fisicamente de nós, mas nem sempre ausentes – seus espíritos são invisíveis, mas eles nos tocam e nos inspiram ao bem e ao amor a Deus.
Arnaldo Divo Rodrigues de Camargo é editor da Editora EME