Inesperado x Previsível

[Carlos Eduardo Cavalini] carloseduardo.cavalini@hotmail.com

Muitas vezes pensamos estar no controle de tudo o que nos acontece na vida. Achamos que podemos controlar e prever cada um dos eventos que chega até nós.

A palavra controle pressupõe a existência do medo. O medo sempre está presente quando pensamos em controle. Temos medo de perder aquilo que já possuímos ou de não conseguirmos o que desejamos, ou ainda medo de não ter quem amamos ao nosso lado. No fundo, temos medo das mudanças e do inesperado, do desconhecido. Estamos seguros no pequeno mundo que criamos. Não queremos mudar por que o desconhecido nos assusta. É preferível ficar no lugar em que estamos do que correr o risco e as coisas piorarem.

Nós nos acostumados com nosso emprego, mesmo que não seja o emprego dos nossos sonhos. Este é um momento de crise em nosso país e é melhor ter pouco do que não ter nada. Nosso emprego é a garantia de que teremos no final do mês um salário para alimentar nossos filhos, pagar nossas dívidas, talvez viajarmos no final do ano, se economizarmos bastante, é claro. Concordo que seria imprudente largarmos nosso emprego para irmos atrás, de repente, de um sonho de infância. Mas se aquilo que fazemos no dia a dia tornou-se uma rotina, algo completamente previsível, ou talvez o contrário, tão imprevisível que nos deixa preocupados ou ansiosos o dia inteiro, então devemos reencontrar aquilo que foi perdido no meio do caminho. Se passamos a maior parte do tempo nos dedicando a uma tarefa que não vai de encontro às nossas aspirações internas, então algo não está bem.

Não estou dizendo para jogarmos tudo para o alto. Buscar aquilo que se perdeu no caminho é tentar enxergar o inesperado naquilo que sempre foi previsível. Se nos perdemos ao longo da vida fazendo coisas que não estão de acordo com o que realmente desejamos, então é hora de fazermos algo que não foi feito até o momento: prestar atenção. Vamos ficar à espreita de nós mesmos, como observadores em potencial. Vamos nos voltar para as tarefas diárias como se não as conhecêssemos, como se fosse a primeira vez que escovamos os dentes ou tomamos uma xícara de café, ou ainda calçamos os sapatos, por exemplo. Olhemos para uma criança. Uma criança é capaz de se maravilhar com o mais simples gesto. Vamos seguir o exemplo das crianças, que são atentas, observadoras e agem de acordo com o que estão sentindo, agem de acordo com sua natureza.

Talvez se nos “deixássemos levar” pela vida e prestássemos atenção, teríamos as respostas que sempre buscamos. Abrir os olhos para o inesperado, sem o medo que tanto influencia o ser humano, perceber que a todo momento somos guiados por mãos invisíveis… O inesperado surge a todo instante se estivermos atentos. Nós é que o transformamos em algo previsível, calculado, rotineiro. Então, perdeu-se o encanto, e nós nos perdemos com ele.

Os dizeres de um livro, um filme, uma música, uma mensagem nas redes sociais, uma pessoa desconhecida que nos cumprimenta na rua, uma borboleta que pousa em nosso ombro, o canto de um pássaro, o sorriso de um bebê, a noite que cai… É o inesperado acontecendo.

Depois de tantos anos nos rendendo à nossa rotina diária, tentando mantê-la sob nosso controle, nem que para isso tivéssemos nos tornado reféns do medo, intensificado pela sociedade em que vivemos, depois de tanto procurarmos uma forma de mudar nossas vidas, para que fôssemos capazes de expressar nossos mais profundos desejos, tudo ainda parece igual. Tudo o que fazemos não dá resultado e o círculo continua girando sem sair do lugar.

Mas talvez, se durante certo período de tempo, pudermos observar intensamente nossa rotina diária, se pudermos seguir os passos de uma criança, como foi citado acima, algo, de maneira inesperada, possa nos saltar aos olhos. E então, naturalmente, saberíamos como proceder, como se a resposta sempre estivesse estado ao nosso alcance.

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