Morte, onde está a tua vitória?

[Fabio Dionisi] fabio@editoradionisi.com.br

Não há como negar que o grande objetivo do Mestre foi a de nos trazer a Boa Nova, sintetizada magistralmente na Lei do Amor. Toda a Lei e todos os Profetas foram resumidos no amor ao Pai, acima de todas as coisas, e ao próximo como a nós mesmos.
Se Moisés, incumbido por Jesus, trouxe a missão da justiça, o Mestre se encarregou pessoalmente do cerne da Revelação. Confirmado por Emmanuel, quando nos esclarece que os dez mandamentos, recebidos mediunicamente por Moisés no Monte Sinai, são até hoje a base de toda justiça no mundo: “As seitas religiosas (…) procuram modificar os textos sagrados; todavia, apesar das alterações transitórias, os dez mandamentos (…) voltam sempre a ressurgir na sua pureza primitiva, como base de todo o direito no mundo, sustentáculo de todos os códigos da justiça terrestre”; para, logo em seguida, ensinar: “(…) a Humanidade (…) recebeu a grande Revelação em três aspectos essenciais: Moisés trouxe a missão da Justiça; o Evangelho, a revelação insuperável do Amor, e o Espiritismo, (…) a sublime tarefa da Verdade. No centro das três revelações encontra-se Jesus Cristo (…). É que, com Amor, a Lei manifestou-se na Terra no seu esplendor máximo; a Justiça e a Verdade nada mais são que os instrumentos divinos de sua exteriorização (…)”. [O Consolador. Q. 268 e 271]
Contudo, para alcançar o êxito, Jesus precisou também trazer a confirmação da vida futura. Tanto que Kardec a colocou como o eixo central do ensino de Jesus.
“Com efeito, sem a vida futura, nenhuma razão de ser teria a maior parte dos Seus preceitos morais, donde vem que os que não creem na vida futura (…) não os compreendem (…). Esse dogma pode, portanto, ser tido como o eixo do ensino do Cristo (…)”. [Kardec. ESE. Cap. II. Item 2]
De fato, para que seguir a Lei do Amor se não existisse o porvir? De que adiantaria fazer o bem se o “nada” aguardasse o homem após sua morte física?
Jesus, por isso, a divulgou: “(…) Jesus lhe revelou que há outro mundo, onde a justiça de Deus segue o seu curso. É esse o mundo que ele promete aos que cumprem os mandamentos de Deus e onde os bons acharão sua recompensa”. [Kardec. ESE. Cap. II. Item 3]
A bem da verdade, faz-se necessário esclarecer que muitos já acreditavam em algo após a morte; porém este conhecimento era, para a esmagadora maioria, tão confuso, tão incompleto, e sem objetivo prático, que necessário se fazia dar-lhe um sentido.
“É curioso constatar que não havia, sobre este ponto, um ensino preciso, único; a religião judaica, tão minuciosa em tudo, deixava cada um livre de acreditar o que quisesse sobre o sentido da morte e sobre o além. Segundo a seita a que pertencia, esperava ou não numa outra vida”. 1
Os Fariseus acreditavam na suprema sabedoria com que Deus conduz todas as coisas, na imortalidade da alma, na eternidade das penas e na ressurreição dos mortos.
Os Saduceus, por sua vez, não aceitavam tal imortalidade, e tão pouco a ressurreição; pois afirmavam que estes dogmas não se encontravam no Pentateuco. Da mesma forma que os Samaritanos, eles só reconheciam como inspirados estes primeiros cinco livros bíblicos. Apesar disso, acreditavam em Deus. E, embora nada esperassem após a morte, criam nas recompensas ou punições temporais. Aliás, explique-se, de passagem, que os Hebreus acreditavam que os prêmios e as punições de Deus ocorriam aqui mesmo, na Terra. Tanto que o quarto mandamento, no seu texto original, faz referência à terra prometida como recompensa; lembrando que se encontravam no deserto. “Honrai a vosso pai e a vossa mãe, a fim de viverdes longo tempo na terra que o Senhor vosso Deus vos dará.” (Decálogo: Êxodo, 20:12)
Por seu turno, os Essênios e os Terapeutas aceitavam como verdadeiras: a imortalidade da alma e a ressurreição.
Esta era a situação. Nada estranha, uma vez que o Tanach, conjunto principal de livros sagrados do judaísmo: Torá, os Profetas, e os Escritos, com exceção de algumas passagens controvertidas, não fazia referência a uma vida após a morte, e nem a um céu ou inferno. E, se boa parte dos judeus assimilaram doutrinas como o da imortalidade da alma, da ressurreição ou do juízo final, isso ocorreu durante o exílio na Babilônia (586 – 538 a.C.).1
Nos dias de Jesus, portanto, uma parte numerosa do Povo de Deus acreditava que a alma é imortal e que ressuscitamos. Sobre esta última, contudo, existiam muitas teorias, mas pouca concordância. A alma voltaria ao corpo; mas, e depois? Como seria a vida após a ressurreição? Morreríamos novamente? Haveria alguma compensação para os cumpridores do Torá ? Tudo era muito incerto. [Torá: os 5 livros conhecidos como Pentateuco (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio)}.
Jesus sabia que o homem tinha que vislumbrar uma recompensa tangível para decidir-se pela transformação moral. E foi o que fez; deu-lhe uma boa razão. Mesmo não podendo dizer tudo, dosou-a, inteligentemente, de acordo com o grau de evolução do homem da época.
Apresentou o futuro; com suas compensações para os que fizessem a vontade do Criador, e com suas consequências nefastas para os rebeldes. “Quando o filho do homem vier (…) serão reunidas diante dele todas as nações, separará as ovelhas (…) à sua direita e os cabritos à sua esquerda. Então, o Rei dirá aos {que estiverem} à sua direita: Vinde, benditos do meu Pai, herdai o reino preparado para vós (…). Então dirá aos {que estiverem} à sua esquerda: Afastai-vos de mim, amaldiçoados, para o fogo eterno, preparado para o diabo”. (Mateus, 25:31 a 41)
Voltemos, por um instante, ao nosso comentário sobre o quarto mandamento. Na ocasião, Jesus o retifica. Anuncia que as compensações serão na vida espiritual: “(…) já eles tinham mais desenvolvidas suas ideias. (…) o mesmo Jesus os inicia na vida espiritual, dizendo: “Meu reino não é deste mundo; lá, e não na Terra, é que recebereis a recompensa das vossas boas obras.” A estas palavras, a Terra Prometida deixa de ser material (…). Por isso, quando os chama à observância daquele mandamento (…), já não é a Terra que lhes promete e sim o céu”.
Além disso, embora Jesus mantivesse, em público, a crença na ressurreição (“A Ressurreição dos Mortos”, com os Saduceus; Mateus, 22:23 a 33), veladamente introduz o conceito da reencarnação (“Jesus e Nicodemos”; João, 3:1 a 21)
E, promete enviar o Paracleto para futuros esclarecimentos.
“(O Paracleto) Ainda tenho muitas {coisas} para vos dizer, mas não podeis carregar agora. Quando, porém, aquele vier – O Espírito de Verdade – vos guiará em toda a Verdade”. (João, 16:12 e 13)
E, mais ainda, cumpre a promessa!
Cumpre-a, enviando sua falange de escol para transmitir a Doutrina Espírita à humanidade encarnada do século XIX; comprovando, racionalmente, a existência: de Deus, do mundo espiritual, do Espírito criado imortal, da reencarnação, da pluralidade dos mundos, da comunicação entre os dois mundos etc.; esclarecendo todos os princípios e mecanismos da vida futura; e, anunciando a vitória definitiva sobre a morte, como nas palavras do Apóstolo Paulo: “Quando este corpo corruptível estiver revestido da incorruptibilidade, e quando este corpo mortal estiver revestido da imortalidade, então se cumprirá a palavra da Escritura: A morte foi tragada pela vitória (Is 25,8). Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão (Os 13,14)?” [Paulo. 1ª Carta aos Coríntios (15:54 e 55)]

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1 ROPS, Daniel. A Vida Quotidiana na Palestina no Tempo de Jesus. Parte II. Cap. XII. Item VI. Edição “Livros do Brasil”. Lisboa.

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